Sumiço de abelhas derruba exportações de mel do Brasil
O Brasil caiu da 5ª para a 10ª colocação mundial em exportação de mel nos últimos dois anos. O motivo foi o abandono das colmeias na região produtora mais importante do país, o Nordeste. Em 2012, alguns estados registraram queda de 90% na produção e o abandono de colmeias chegou a 60%.
O desaparecimento das abelhas derruba exportações de mel do Brasil
O Brasil perdeu cinco posições no ranking mundial dos maiores exportadores de Mel. O abandono das colmeias nos estados da região nordeste chegou a 60%. A taxa de desaparecimento de abelhas chegou a 90% em outros estados brasileiros.
Seca no Nordeste diminuiu exportação brasileira de mel em 25%, de acordo com Etene
O Brasil caiu da 5ª para a 10ª colocação mundial em exportação de mel nos últimos dois anos. O motivo foi o abandono das colmeias na região produtora mais importante do país, o Nordeste. Em 2012, alguns estados registraram queda de 90% na produção e o abandono de colmeias chegou a 60%.
“A queda no Nordeste reflete diretamente nas exportações nacionais de mel. A região é uma das maiores produtoras e exportadoras do país” explica Maria de Fátima Vidal, coordenadora de estudos e pesquisas do Etene (Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste).
Cerca de 46 mil pequenos apicultores em nove estados nordestinos vivem da atividade e, juntos, respondem por 40% da produção de mel no país – em épocas com índice normal de chuva. Por trás do sumiço das abelhas está a seca que atinge a região nordeste há pelo menos 24 meses.
Além das alterações climáticas, bactérias e uso de agrotóxicos são citados como causas da mortalidade das abelhas no Brasil. Mas a falta de documentação sobre o desaparecimento de enxames dificulta o trabalho de controle e monitoramento da situação.
O Banco do Nordeste prevê que o problema não deve melhorar até 2015. Neste ano, as perspectivas de pouca chuva estão se confirmando e, para o próximo, mesmo que haja precipitação normal, a recuperação das colmeias deve ser lenta.
Mel, um dos alimentos mais saudáveis a disposição do ser humano
“Isso ocorre porque o período de chuvas no Nordeste é curto sendo que, quando ocorrem as floradas, os novos enxames primeiro puxam cera e fortalecem as famílias e, somente depois, no final do período chuvoso, é que começam a produzir mel”, afirma Vidal, em artigo assinado pela Etene, órgão do Banco do Nordeste.
Santa Catarina bate recorde depois de perda histórica:
Os produtores de Santa Catarina também sofreram com o desaparecimento dos insetos. Em 2011, pior ano, segundo a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), o estado produziu cerca de 4 mil toneladas, enquanto a média anual é de 6 mil. “Muitas famílias deixaram a apicultura”, lembra Walter Miguel, engenheiro gerente do Centro de Desenvolvimento Apícola da Epagri.
Cerca de 30 mil famílias atuam na atividade no estado do Sul e são responsáveis por cerca de 300 mil colméias. Em 2011, o desaparecimento de abelhas chegou a quase 100% em algumas regiões. A floração de culturas como maçã e pêra foi prejudicada por causa da ausência das abelhas. “Estima-se que mais de 10% da produção agropecuária tenha sido comprometida pela falta das polinizadoras”, destaca Miguel. Nessa parte do Brasil, o frio foi um dos principais motivos que ocasionou o sumiço dos insetos.
A polinização de várias culturas pelas abelhas é responsável pela produção de vários alimentos
Após ações de manejo e orientação dos apicultores, as abelhas retornaram e a produção bateu recorde na última safra: 7 mil toneladas. Além do frio intenso, doenças, manejo inadequado e uso de agrotóxicos contribuíram para a queda da produtividade e sumiço dos insetos. Situação que preocupa pesquisadores, entidades governamentais e apicultores de todo o Brasil.
Síndrome do Colapso das Abelhas
Em países como Estados Unidos, Canadá, Japão, Índia e em nações da União Europeia, o problema é caracterizado como Síndrome do Colapso das Abelhas (CCD, sigla em inglês para Colony Collapse Disorder). Trata-se de um abandono repentino e massivo de colmeias. A situação é grave e, em estados norte-americanos chegou a comprometer a produção agrícola, já que a floração é feita quase que exclusivamente através desse inseto. De acordo com a Confederação Brasileira de Apicultura (CBA), entre 2007 e 2008 aquele país perdeu cerca de 1 milhão de abelhas.
“Hoje, sabe-se que elas desempenham um papel fundamental na agropecuária. Cerca de 80% de tudo o que é consumido no mundo é polinizado pelas abelhas. A ausência delas reflete-se com impacto direto sobre a agricultura”, afirma Walter Miguel, engenheiro agrônomo gerente do Centro de Desenvolvimento Apícola da Epagri.
Márcio Freitas, coordenador geral de avaliação de substâncias tóxicas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), explica que até o momento há dois casos que se assemelham com CCD no país, em São Paulo e Minas Gerais.
Ibama investiga ação dos agrotóxicos neonicotinóides e seus efeitos sobre o organismo das abelhas
Agrotóxicos estão entre as causas do sumiço de enxames de abelhas
Segundo o especialista, a falta de dados concretos de todas as regiões brasileiras compromete a análise das causas do desaparecimento das abelhas. “Como em muitas regiões do país, a apicultura não ocorre de forma organizada, por isso, muitos casos de desaparecimento não são documentados. Há cerca de cem casos informados “, comenta Freitas.
Apesar de descartar o CCD, o Ibama indica que os defensivos agrícolas estão entre os três principais causadores do desaparecimento de abelhas no Brasil. Eles matam os insetos imediatamente após a aplicação ou afetam seu sistema sensor, fazendo com que ele não consiga retornar à colmeia, enfraquecendo o enxame.
Desde 2010, a entidade analisa três tipos de neonicotinóides, defensivos agrícolas apontados por estudos internacionais como causadores deste fenômeno. Caso se confirme os efeitos nocivos, medidas mais rigorosas para proteger os insetos devem ser adotadas. A expectativa é que, até 2014, os primeiros resultados conclusivos estejam prontos. Em 2012, uma portaria do Ibama restringiu o uso destas substâncias durante o período de floração.
Em abril de 2013, 15 dos 27 países da União Europeia suspenderam o uso desses defensivos agrícolas. José Cunha, presidente da CBA, garante que existe um esforço conjunto entre os órgãos apícolas e o setor agrícola para mitigar os efeitos dos agrotóxicos sobre os polinizadores. “O Brasil não pode se desenvolver sem o agronegócio e o meio ambiente não vive sem os polinizadores”, analisa, Ele enfatiza que, se forem adotadas medidas de fomento e proteção à atividade, a produção anual pode pular de 50 mil para 200 mil toneladas no país.
Permitida a reprodução, desde que mantido no formato original e mencione as fontes.
Entrevista com a pesquisadora Vera
Imperatriz Fonseca, coordenadora do Grupo da Plataforma
Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES),
responsável em avaliar as causas do declínio de espécies polinizadores.
Entrevista para a Agência Fapesp - setembro de 2014.
Leia mais em:
Força-tarefa internacional fará diagnóstico sobre polinização no mundo:
Perda de espécies de polinizadores é um problema global
Vídeo (? )
O Mundo sem as Abelhas - 10min.
O Mundo Invisível das Abelhas - 8min.
Onde começa a Vida - 4min.
Entrevista com a pesquisadora Vera
Imperatriz Fonseca,
coordenadora do Grupo da Plataforma
Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES),
responsável em avaliar as causas do declínio de espécies polinizadores.
Entrevista para a Agência Fapesp - setembro de 2014.
Polinização: A Importância das Abelhas - 6min.
A Beleza da Polinização -4min.
Sabiás e Abelhas - Polinização - 6min.
Insetos Polinizadores - 2min.
Leia mais em:
Força-tarefa internacional fará diagnóstico sobre polinização no mundo:
Agência FAPESP – Um grupo de 75 pesquisadores de diversos
países-membros da Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e
Serviços Ecossistêmicos (IPBES, na sigla em inglês), que reúne 119
nações de todas as regiões do mundo, fará uma avaliação global sobre
polinizadores, polinização e produção de alimentos.
O escopo do projeto foi apresentado na última quarta-feira (17/09) em
São Paulo, no auditório da FAPESP, em um encontro de integrantes do
organismo intergovernamental independente, voltado a organizar o
conhecimento sobre a biodiversidade no mundo e os serviços
ecossistêmicos.
“A ideia do trabalho é avaliar todo o conhecimento existente sobre
polinização no mundo e identificar estudos necessários na área para
auxiliar os tomadores de decisão dos países a formular políticas
públicas para a preservação desse e de outros serviços ecossistêmicos
prestados pelos animais polinizadores”, disse Vera Imperatriz Fonseca,
do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP) e do
Instituto Tecnológico Vale Desenvolvimento Sustentável (ITVDS), à Agência FAPESP.
“Já estamos conhecendo melhor o problema [da crise da polinização no mundo].
Agora, precisamos identificar soluções”, disse a pesquisadora, que
coordena a avaliação ao lado de Simon Potts, professor da University of
Reading, do Reino Unido.
De acordo com Fonseca, há mais de 100 mil espécies de animais
invertebrados polinizadores no mundo, dos quais 20 mil são abelhas. Além
de insetos polinizadores – que serão o foco do relatório –, há também
cerca de 1,2 mil espécies de animais vertebrados, tais como pássaros,
morcegos e outros mamíferos, além de répteis, que atuam como
polinizadores.
Estima-se que 75% dos cultivos mundiais e entre 78% e 94% das flores silvestres do planeta dependam da polinização por animais, apontou a pesquisadora.
“Há cerca de 300 mil espécies de flores silvestres que dependem da polinização por insetos”, disse Fonseca. “O valor anual estimado
desse serviço ecossistêmico prestado por insetos na agricultura é de
US$ 361 bilhões. Mas, para a manutenção da biodiversidade, é
incalculável”, afirmou.
Nos últimos anos registrou-se uma perda de espécies nativas de
insetos polinizadores no mundo, causada por, entre outros fatores,
desmatamento de áreas naturais próximas às lavouras, uso de pesticidas e
surgimento de patógenos.
Se o declínio de espécies de insetos polinizadores se tornar
tendência, pode colocar em risco a produtividade agrícola e,
consequentemente, a segurança alimentar nas próximas décadas, disse a
pesquisadora.
“A população mundial aumentará muito até 2050 e será preciso produzir
uma grande quantidade de alimentos com maior rendimento agrícola, em um
cenário agravado pelas mudanças climáticas. A polinização por insetos
pode contribuir para solucionar esse problema”, afirmou Fonseca.
Segundo um estudo internacional, publicado na revista Current Biology, estima-se que o manejo de colmeias de abelhas utilizadas pelos agricultores para polinização – como as abelhas domésticas Apis mellifera L, amplamente criadas no mundo todo – tenha aumentado em cerca de 45% entre 1950 e 2000.
As áreas agrícolas dependentes de polinização, no entanto, também
cresceram em mais de 300% no mesmo período, apontam os autores da
pesquisa.
“Apesar de ter aumentado o manejo de espécies de abelhas
polinizadoras, precisamos muito mais do que o que temos no momento para
atender às necessidades da agricultura”, avaliou Fonseca.
O declínio das espécies de polinizadores no mundo estimula a
polinização manual em muitos países. Na China, por exemplo, é comum o
comércio de pólen para essa finalidade, afirmou a pesquisadora.
“Na ausência de animais para fazer a polinização, tem sido feita a
polinização manual de lavouras de culturas importantes, como o dendê e a
maçã. No Brasil se faz a polinização manual de maracujá , tomate e de
outras culturas”, disse.
Falta de dados
Segundo Fonseca, já há dados sobre o declínio de espécies de abelhas,
moscas-das-flores (sirfídeos) e de borboletas na Europa, nos Estados
Unidos, no Oriente Médio e no Japão.
Um estudo internacional, publicado no Journal of Apicultural Research, apontou perdas de aproximadamente 30% de colônias de Apis mellifera L em decorrência da infestação pelo ácaro Varroa destructor,
que diminui a vida das abelhas e, consequentemente, sua atividade de
polinização nas flores, em especial nos países do hemisfério Norte.
Na Europa, as perdas de colônias de abelhas em decorrência do
ácaro podem chegar a 53% e, no Oriente Médio, a 85%, indicam os autores
do estudo. No entanto, ainda não há estimativas sobre a perda de
colônias e de espécies em continentes como a América do Sul, África e
Oceania.
“Não temos dados sobre esses continentes. Precisamos de informações
objetivas para preenchermos uma base de dados sobre polinização em nível
mundial a fim de definir estratégias de conservação em cada país”,
avaliou Fonseca. “Também é preciso avaliar os efeitos de pesticidas no
desaparecimento das abelhas em áreas agrícolas, que têm sido objeto de
estudos e atuação dos órgãos regulatórios no Brasil.”
Outra grande lacuna a ser preenchida é a de estudos sobre interações
entre espécies de abelhas polinizadoras nativas com as espécies criadas
para polinização, como as Apis mellifera L.
Um estudo internacional publicado em 2013 indicou que, quando as Apis mellifera L e
as abelhas solitárias atuam em uma mesma cultura, a taxa de polinização
aumenta significativamente, pois elas se evitam nas flores e mudam mais
frequentemente de local de coleta de alimento, explicou Fonseca.
De acordo com a pesquisadora, uma solução para a polinização em áreas
agrícolas extensas tem sido o uso de colônias de polinizadores
provenientes da produção de colônias em massa, como de abelhas Bombus terrestris, criadas em larga escala e inclusive exportadas.
Em 2004, foi produzido 1 milhão de colônias dessa abelha para uso na agricultura.
Na América do Sul, o Chile foi o primeiro país a introduzir essas
abelhas para polinização de frutas e verduras. Em algumas áreas onde foi
introduzida, entretanto, essa espécie exótica de abelha mostrou ser invasora e ter grande capacidade de ocupar novos territórios.
“É preciso estudar mais a interação entre as espécies para
identificar onde elas convivem, qual a contribuição de cada uma delas na
polinização e se essa interação é positiva ou negativa”, indicou
Fonseca.
“Além disso, a propagação de doenças para as espécies nativas de
abelhas causa preocupação e deve ser um foco da pesquisa nos próximos
anos”, indicou.
Problema global
De acordo com Fonseca, a avaliação intitulada Polinizadores, polinização e produção de alimentos, do IPBES, está em fase de redação e deverá ser concluída no fim de 2015.
Além de um relatório técnico, com seis capítulos de 30 páginas cada, a
avaliação também deverá apresentar um texto destinado aos formuladores
de políticas públicas sobre o tema, contou.
“A avaliação sobre polinização deverá contribuir para aumentar os
esforços de combate ao problema do desaparecimento de espécies de
polinizadores no mundo, que é urgente e tem uma relevância política e
econômica muito grande, porque afeta a produção de alimentos”, afirmou.
A avaliação será o primeiro diagnóstico temático realizado pelo IPBES
e deverá ser disponibilizada para o público em geral em dezembro de
2015. O painel planeja produzir nos próximos anos outros levantamentos
semelhantes sobre outros temas como espécies invasoras, restauração de habitats e cenários de biodiversidade no futuro.
Uma estratégia adotada para tornar os diagnósticos temáticos mais
integrados foi a criação de forças-tarefa – voltadas à promoção da
capacitação profissional e institucional, ao aprimoramento do processo
de gerenciamento de dados e informações científicas e à integração do
conhecimento tradicional indígena e das pesquisas locais aos processos
científicos –, que deverão auxiliar na produção do texto final.
“O IPBES trabalha em parceria com a FAO [Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura], Unep [Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente], CBD [Convention on Biological Diversity], Unesco [Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura] e todos os esforços anteriores que trataram do tema de polinização”, afirmou Fonseca.
A polinização foi o primeiro tópico a ser escolhido pelos
países-membros da plataforma intergovernamental, entre outras razões,
por ser um problema global e já existir um grande número de estudos
sobre o assunto, contou Carlos Joly, coordenador do Programa FAPESP de
Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável
da Biodiversidade (BIOTA-FAPESP) e membro do Painel Multidisciplinar de
Especialistas do IPBES.
“Como já há um arcabouço muito grande de dados sobre esse tema,
achamos que seria possível elaborar rapidamente uma síntese. Além disso,
o tema tem um impacto global muito grande, principalmente por estar
associado à produção de alimentos”, avaliou Joly.
Os 75 pesquisadores participantes do projeto foram indicados pelo
Painel Multidisciplinar de Especialistas do IPBES, que se baseou nas
indicações recebidas dos países-membros e observadores da plataforma
intergovernamental.
Dois do grupo são escolhidos para coordenar o trabalho, sendo um de
um país desenvolvido e outro de uma nação em desenvolvimento.
“O convite e a seleção da professora Vera Imperatriz Fonseca como
coordenadora da avaliação é reflexo da qualidade da ciência desenvolvida
nessa área no Brasil e da experiência dela em trabalhar com
diagnósticos nacionais”, avaliou Joly. “Gostaríamos de ter mais
pesquisadores brasileiros envolvidos na elaboração dos diagnósticos do
IPBES.”
Painel Intergovernamental discute capacitação para pesquisas em biodiversidade
18 de setembro de 2014
Por Karina Toledo
Agência FAPESP – A capacidade de produzir e tornar acessíveis
conhecimentos científicos de qualidade que possam auxiliar na formulação
de políticas públicas voltadas à proteção da biodiversidade e ao
desenvolvimento sustentável varia enormemente entre os diversos países
do globo.
Cientes dessa assimetria, os membros da Plataforma Intergovernamental de
Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) aprovaram em seu
primeiro programa de trabalho – que compreende as atividades previstas
para os anos de 2014 a 2018 – a criação de uma força-tarefa voltada a
promover a capacitação profissional e institucional necessária para
atender às demandas da organização.
Membros dessa força-tarefa estiveram reunidos nos dias 15 e 16 de
setembro, em São Paulo, com acadêmicos, representantes do setor privado,
de organizações não governamentais, de programas ambientais da
Organização das Nações Unidas (ONU) e outras instituições multilaterais
para discutir estratégias que permitam levantar os recursos técnicos e
financeiros necessários.
“O IPBES tem quatro principais funções: realizar um diagnóstico sobre o
estado do conhecimento da biodiversidade no mundo, oferecer diretrizes
para a geração de novos conhecimentos e para o gerenciamento das
informações, apoiar o desenvolvimento de políticas públicas e, por
último, oferecer capacitação para que todas essas três outras funções
possam acontecer e para garantir a participação efetiva de todos os
países membros”, explicou Ivar Baste, membro da diretoria do IPBES e
co-coordenador da força-tarefa de capacitação.
Segundo Baste, o objetivo do encontro em São Paulo foi entender como tornar o processo de capacity building
mais sustentável. “Queremos levantar lições aprendidas com experiências
anteriores, entender como podemos nos conectar com iniciativas de
capacitação já existentes e como podemos comunicar, de maneira mais
eficaz, a importância da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos
para o desenvolvimento sustentável e o avanço do bem-estar humano”,
afirmou.
De acordo com Carlos Alfredo Joly – que, além de coordenar o programa
BIOTA-FAPESP, é membro do Painel Multidisciplinar de Especialistas do
IPBES e integrante da força-tarefa de capacitação –, todos os 119 países
que compõem a plataforma foram consultados sobre suas demandas por
treinamento profissional.
“Fizemos uma triagem para selecionar prioridades e avaliar como podemos
atender à demanda. Neste encontro, estamos discutindo iniciativas
semelhantes desenvolvidas pela Convenção da Biodiversidade, pelo
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e outras
experiências anteriores para avaliar o que podemos acrescentar de novo”,
disse Joly.
As discussões visaram a fornecer subsídios a uma segunda reunião, também
em São Paulo, entre os dias 17 e 19 de setembro, na qual os membros da
força-tarefa elaboram as propostas de trabalho para aprovação na
plenária do IPBES, agendada para janeiro de 2015.
Uma das principais propostas é a criação de uma matchmaking facility,
ou seja, uma ferramenta que permita reunir em um mesmo contexto as
demandas por capacitação dos diversos parceiros e as ofertas de apoio
feitas por instituições e indivíduos.
Iniciativa similar foi apresentada por Richard Byron-Cox, diretor de
Capacitação do Secretariado da Convenção de Combate à Desertificação das
Nações Unidas (UNCCD, na sigla em inglês) e idealizador do portal Capacity Building Marketplace.
“Há uma grande demanda por capacitação e há também muitas pessoas e
instituições dispostas a apoiar. O problema é que a demanda está em um
lugar, e a oferta, em outro. Esse mercado online pretende ser um lugar
de encontro entre aqueles que têm algo a pedir e os que têm algo a
oferecer, seja um treinamento, um trabalho voluntário ou uma
consultoria, sejam recursos financeiros para doação”, disse Byron-Cox.
Como um dos representantes do setor privado, Luiz Eugênio Mello, diretor
do Instituto Tecnológico Vale, ressaltou em entrevista à Agência FAPESP
que o encontro tornou clara a possibilidade de identificar “objetivos
comuns”, que permitam a “interação entre governos, academia e a
iniciativa privada para a consecução das metas da plataforma”.
“A Vale é uma empresa que está presente em 30 dos 119 países membros do
IPBES e tem interesse concreto de olhar para a biodiversidade em
praticamente todos eles. Também dispõe de recursos valiosíssimos.
Mantém, por exemplo, uma reserva natural em Linhares (ES), que é a maior
área contígua de floresta de baixa altitude remanescente na Mata
Atlântica. Opera também a maior mina de ferro do mundo, onde mantém a
Floresta Nacional de Carajás (PA). Ambos são locais ideais para a
realização de inventários e para o treinamento de pessoas”, disse Mello.
Já Stanley Asah, professor da University of Washington, dos Estados
Unidos, falou durante o encontro sobre como os membros do IPBES podem
aprimorar sua comunicação para obter maior engajamento de parceiros.
“Para os membros da força-tarefa de capacitação, por exemplo, é
importante saber mostrar a possíveis doadores como eles podem se
beneficiar com a doação. Mas recrutar doações é fácil, a parte difícil é
mantê-las no longo prazo. Para isso, é preciso examinar como estão
mudando as motivações e os interesses dos doadores e adaptar o programa
de forma que ele continue atendendo a essas expectativas e aos objetivos
do IPBES”, disse.
Metas para 2018
Em um evento aberto à comunidade realizado no dia 17 de setembro, na
sede da FAPESP, os membros do IPBES apresentaram um panorama do programa
de trabalho da plataforma para o período entre 2014 e 2018.
Durante a abertura, o presidente da FAPESP, Celso Lafer, destacou que a
participação de Joly nas iniciativas do IPBES é um desdobramento de seu
trabalho no Programa FAPESP de Pesquisas em Caracterização, Conservação,
Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (BIOTA-FAPESP).
Lafer também destacou a contribuição que a FAPESP tem oferecido para o
processo decisório e a formulação de políticas públicas por meio de seus
três principais programas de pesquisa: o BIOTA, o Programa FAPESP de
Pesquisa em Bioenergia (BIOEN) e o Programa FAPESP de Pesquisa sobre
Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG).
“É indispensável a relação entre ciência e o processo decisório, sobretudo na área ambiental. Tendo participado como ministro [das Relações Exteriores] da Rio 92 [Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento] e
da Rio +10, sempre tive muito cuidado e atenção em relação a esses
aspectos e é por isso que tenho muito orgulho dos três grandes programas
que a FAPESP apoia e sustenta”, disse Lafer.
Baste afirmou que o legado da Rio 92 é impressionante e foi responsável
por colocar o mundo em uma trajetória de desenvolvimento sustentável.
Além da força-tarefa de capacitação, estão previstas outras duas
iniciativas semelhantes no programa de trabalho do IPBES: uma voltada a
aprimorar o processo de gerenciamento de dados e informações científicas
e outra para integrar o conhecimento indígena e as pesquisas locais nos
processos científicos e na avaliação e contabilização de biodiversidade
e serviços ecossistêmicos.
Também está programado um conjunto de avaliações globais e regionais
sobre temas como agentes polinizadores e sua relação com a produção de
alimentos, o problema das espécies invasoras e os processos de
degradação da terra e de restauração.
A ideia é que, até dezembro de 2018, seja divulgado o diagnóstico global
do status da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos – relatório
que deverá orientar a tomada de decisão em todas as convenções da área
(leia mais em: http://agencia.fapesp.br/18410).
“Já em 2015 começam a ser feitos os diagnósticos regionais. Para o
Brasil participar efetivamente da elaboração de um bom relatório sobre
América Latina e Caribe, precisaríamos ter um bom diagnóstico nacional
sobre o estado dos ecossistemas e da biodiversidade, sobre como
alterações antrópicas alteraram seu funcionamento e os impactos nos
serviços ecossistêmicos. Como ainda não temos esse diagnóstico, vamos
precisar trabalhar simultaneamente no nível nacional e regional. Isso só
será possível com o forte engajamento da comunidade científica que atua
nessa área no Brasill”, disse Joly.